Enzima lactase: quando tomar e qual a duração dos efeitos?

Antes de falarmos sobre o tempo adequado entre a ingestão da lactase e a alimentação com leite ou derivados, vamos falar um pouco sobre os açúcares presentes na nossa dieta e como é feita a digestão deles.

Quando pensamos em açúcar, logo imaginamos o açúcar comum que compramos no supermercado. Este açúcar normalmente vem da cana de açúcar. Mas você sabia que existem outras fontes alimentares que produzem açúcar? Exemplos de alimentos que contêm naturalmente o açúcar são as frutas e o leite.

O leite de origem animal é composto de gorduras, proteínas, carboidratos, vitaminas e minerais. Os carboidratos são uma parte essencial da dieta humana e podem ser encontrados em formas muito simples e mais fáceis de serem absorvidas (monossacarídeos) ou mais complexas (dissacarídeos e polissacarídeos), formadas a partir da combinação dos açúcares simples, sendo necessário passar por processos de digestão que facilitem sua absorção pelo corpo.¹

A lactose, o principal carboidrato do leite de origem animal, é um dissacarídeo e a sua quebra em moléculas menores, para que seja absorvido pelo organismo, é realizada pela enzima lactase. Mas, pesquisas apontam que após a primeira infância, há uma redução natural na produção da lactase intestinal e que esse fenômeno ocorre de maneira diferente entre as inúmeras populações ao redor do mundo.^2–4 Além disso, vale lembrar que nem todas as pessoas que apresentam a deficiência da lactase, desenvolvem a intolerância à lactose e sentem os sintomas como inchaço e cólicas.^2–4

Para as pessoas que apresentam a intolerância à lactose, a suplementação com a enzima lactase é uma das principais alternativas para a redução do desconforto associado à ingestão de leite e seus derivados devido a sua capacidade de digerir a lactose e, consequentemente, melhorar os desconfortos digestivos.⁵

A lactase é uma enzima segura pois age exclusivamente na presença da lactose e sua ação é determinada por condições específicas como o pH do trato gastrointestinal, além de possuir ação momentânea.⁶

Mas, por quanto tempo posso comer alimentos com leite ou derivados após tomar a enzima?

Um dos principais fatores envolvidos na digestão de alimentos é o tempo do trânsito do trato gastrointestinal, que é diferente entre cada indivíduo. O açúcar lactose permanece em nosso organismo durante todo o processo digestivo até alcançar o intestino delgado onde, em condições de produção normal da enzima lactase, ele será digerido e absorvido dentro de algumas horas.⁷

Quando há redução natural da produção de lactase e recomendação médica para a suplementação com a enzima, a ingestão do complemento alimentar deve ser realizada antes de se consumir o alimento com leite e seus derivados.^8,9 Dessa forma, quando a lactose chegar ao intestino delgado, a enzima estará na sua forma ativa para realizar a quebra do açúcar e favorecer a sua absorção pela mucosa intestinal antes do seu deslocamento para o intestino grosso, que é onde ocorre a fermentação da lactose responsável pelos desconfortos abdominais (Figura 1).¹⁰

Figura 1. Processo de digestão da lactose.

Legenda: Ilustração da digestão de lactose em condições normais, com a quebra da molécula da lactose em glicose e galactose seguida pela absorção dos açúcares (à esquerda) e na ausência da enzima lactase, resultando na quebra da lactose através da fermentação no intestino grosso que resulta na formação de gases e estufamento abdominal. Adaptado de “A digestão dos carboidratos na intolerância à lactose”.¹¹

É importante destacar que a dosagem ideal, bem como o tempo de duração do efeito da enzima lactase deve ser avaliada pelo médico ou nutricionista para realizar o ajuste de acordo com a quantidade de lactose presente em cada refeição, visto que as enzimas possuem uma capacidade limitada de digestão dos açúcares e a duração da ação da lactase no organismo depende das características fisiológicas do trato gastrointestinal de cada pessoa.¹²

O consumo diário de lactase, através da suplementação, é seguro, desde que sejam seguidas as orientações médicas e/ou nutricionais para a utilização do suplemento alimentar em combinação com uma dieta equilibrada e hábitos de vida saudáveis.

Referências

1. Rings EHHM, van Beers EH, Krasinski SD, et al. Lactase; Origin, gene expression, localization, and function. Nutrition Research. 1994;14(5):775-797. doi:10.1016/S0271-5317(05)80212-X

2. Forsgård RA. Lactose digestion in humans: intestinal lactase appears to be constitutive whereas the colonic microbiome is adaptable. Am J Clin Nutr. 2019;110(2):273-279. doi:10.1093/ajcn/nqz104

3. Ségurel L, Bon C. On the Evolution of Lactase Persistence in Humans. Annu Rev Genomics Hum Genet. 2017;18(1):297-319. doi:10.1146/annurev-genom-091416-035340

4. Vionnet N, Münger LH, Freiburghaus C, et al. Assessment of lactase activity in humans by measurement of galactitol and galactonate in serum and urine after milk intake. Am J Clin Nutr. 2019;109(2):470-477. doi:10.1093/ajcn/nqy296

5. Ianiro G, Pecere S, Giorgio V, Gasbarrini A, Cammarota G. Digestive Enzyme Supplementation in Gastrointestinal Diseases. Curr Drug Metab. 2016;17(2):187-193. doi:10.2174/138920021702160114150137

6. Freire AC, Podczeck F, Sousa J, Veiga F. Liberação específica de fármacos para administração no cólon por via oral. I - O cólon como local de liberação de fármacos. Revista Brasileira de Ciências Farmacêuticas. 2006;42(3):319-335. doi:10.1590/S1516-93322006000300003

7. Labayen I, Forga L, González A, Lenoir-Wijnkoop I, Nutr R, Martínez JA. Relationship between lactose digestion, gastrointestinal transit time and symptoms in lactose malabsorbers after dairy consumption. Aliment Pharmacol Ther. 2001;15(4):543-549. doi:10.1046/j.1365-2036.2001.00952.x

8. Francesconi CF de M, Machado MB, Steinwurz F, et al. Oral administration of exogenous lactase in tablets for patients diagnosed with lactose intolerance due to primary hypolactasia. Arq Gastroenterol. 2016;53(4):228-234. doi:10.1590/S0004-28032016000400004

9. Bula de Lacday. Disponível em: https://www.lacday.com.br/docs/LACDAY-BULA.pdf. Acessado em 02 de outubro de 2023.

10. Dasgupta A, Wahed A. Inborn Errors of Metabolism. In: Clinical Chemistry, Immunology and Laboratory Quality Control. Elsevier; 2014:213-228. doi:10.1016/B978-0-12-407821-5.00012-7

11. A digestão dos carboidratos na intolerância à lactose. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/5580963/mod_resource/content/5/INTOLER%C3%82NCIA%20%C3%80%20LACTOSE%20-%20Cap%C3%ADtulo-06.indd.pdf. Acessado em 13 de outubro de 2023.

12. Wahlqvist ML. Lactose nutrition in lactase nonpersisters. Asia Pac J Clin Nutr. 2015;24:S21-S25. doi:10.6133/apjcn.2015.24. s1.04

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